terça-feira, 18 de julho de 2017

TIO ZÉ E SEU INVEJÁVEL SENTIDO DE HUMOR


Gozando ainda Tio Zé “Pisco” de uma aparente boa saúde para a sua já provecta idade (91) e mexendo-se também com muito assinalável agilidade (trabalha e cultiva as terras quase como há 15 ou 20 anos atrás), adicionados esses importantes factores à personalidade de que é portador e ao seu invejável sentido de humor que em toda a sua existência sempre o caracterizou, talvez encontremos o segredo para a forma como vem vivendo e atravessando, aparentemente bem, a duríssima transe porque passa e que é, sem dúvida, a mais difícil e complicada da sua vida.

Já o escrevi aquando da partida brusca e sofrida da Tia Tina e repito-o: ocorrida a morte e sofrida a perda, há que de imediato reter todas as atenções nos que ficam e, se logo aí temos o idoso Tio Zé, seu fiel e dedicado companheiro dos últimos 62 anos das suas existências, é dele que nos temos de preocupar e é isso que, como assinalável relevo venho assistindo, quer primeiro dos seus filhos, quer depois de restantes familiares mais próximos.

A Bela e o Tó Zé (bem como o João e a Graça, genro e nora) têm sido absolutamente incansáveis para acompanhar e acarinhar o seu bom pai e eu sei que ele reconhece e aprecia tanta dedicação, tanta estima e tanto amor.
Tem sido um trabalho e uma dedicação impressionantes e que ele bem merece.

Acontece apenas, segundo a minha fraca análise, que o nosso Tio Zé está a atravessar benzinho apenas esta fase da “partida”, do falecimento, mas faltará muito possivelmente a não menos complicada fase da “falta” e, essa verificar-se-á provavelmente no frio e complicado Inverno beirão em que não terá o carinho e atenção da dedicada e velha companheira à lareira, a fazer a cama, a aquecer o quarto. E também não a terá com a mesa posta e a comidinha feita esperando-o à chegada das terras.

Ele já pondera isso mesmo quando diz e repete sem cessar:
- Agora vou para as terras, semeio, rego, cultivo, colho, vejo quem passa na estrada, converso na rua com um ou outro e distraio-me mas, chego a casa e… não há luz… Tenho a luz apagada...

Imagem realista de um homem que viveu 62 anos com uma mulher em que, os dois, eram a unha com a carne. Para onde ia um, ia o outro e, quando um se ausentava, o outro preocupava-se em saber do seu paradeiro. Quantas vezes ouvi a Tia Tina perguntar:
- Onde foi o Zé? Não esteve aqui?
E quantas outras vezes ele não me perguntava:
- A Tina, já foi para baixo?

Tudo perguntas, conversas e situações que marcaram uma época, tiveram um fim e que agora é urgente deixar para trás.E eu quero acreditar que Tio Zé as vai ultrapassar de forma mais ou menos satisfatória. A sua personalidade e o seu muito sentido de humor fazem-me prever isso.

A todo o momento tem e ele faz uso desse sentido de humor de forma invejável e até mesmo impressionante e estou em crer muito o ajuda a viver, como o daquela hora em que velava o corpo da sua amada companheira e, recebendo as condolências de um amigo que tarda em arranjar noiva e casar, com fina ironia lhe lembrou:
- Olha, tu não vais passar pelo que estou a passar!.

Um espanto! O Lelo, surpreendido, saiu da capela e veio segredar-me:
- Sabe o que ele me disse ao ouvido? Que eu não vou passar pelo que ele está a passar.

Este é o humor refinando e inteligente do sofrido Tio Zé que, todavia, não se fica por aqui, como é de calcular. 
Ainda há pouquinho, almoçando aqui comigo e com a Tense, quando conversávamos os três e indagávamos qual dos filhos, que se escalaram para, alternadamente, todas as noites virem jantar com ele e acompanhá-lo na noite viria hoje, ele, depois de nos dar essa informação, nos "atira" e nos deixa positivamente de boca aberta, a olhar um para o outro: 
- Eles têm medo que eu lá meta alguma gaja!…

Pouco faltou para cairmos das cadeiras, perdidos de riso…

Incrível! Incrível e invejável este fino humor do nosso Tio Zé!

NOTA - A foto que junto é da manhã do dia 16 deste mês quando, vindo de regar - "andei a regar os meus tomates", disse... -  e a exemplo de muitas outras vezes, Tio Zé passou para me cumprimentar e conversar um pouquinho antes de seguir para o almoço.

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